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Estados Unidos vivem ‘guerra da vacina’ e começam a ficar para trás na imunização

NYT – Nos Estados Unidos, uma “guerra da vacina” ameaça piorar o novo surto do coronavírus e põe as doses anti-Covid no meio do fogo cruzado político. Se um número crescente de estados e empresas impõe a obrigatoriedade da imunização para seus funcionários, há também Legislativos estaduais e locais que barraram bares, estádios e até mesmo cruzeiros de restringirem a entrada dos não vacinados.

O debate vem em meio ao aumento de casos no país, impulsionado pela variante de Delta, cerca de 60% mais contagiosa. Os novos diagnósticos subiram144% nas últimas duas semanas, chegando a uma média de 56,6 mil por dia pondo em risco a retomada das aulas e do trabalho presencial após as férias de verão do Hemisfério Norte.

A piora também levou o Centro de Prevenção e Controle de Doenças (CDC) a reconsiderar a liberação do uso de máscaras em ambientes fechados. Se nos meados de maio, quando a pandemia parecia estar sob controle, o órgão anunciou que pessoas já vacinadas não precisariam mais usar máscaras em espaços fechados, a partir desta terça elas voltarão a ser recomendadas em áreas com altas taxas de contágio.

As mortes e internações também crescem, mas em ritmo menor que os casos, já um reflexo positivo da vacinação. Até o momento, 56,43% dos americanos já tomaram ao menos uma dose anti-Covid, e 48,79% completaram a inoculação, seja com as duas vacinas da Pfizer e da Moderna ou a injeção única da Janssen, todas elas eficazes contra a Delta. A procura pelos imunizantes, contudo, está estagnada e as campanhas para alavancá-la tem se provado ineficientes.

O país, que chegou a aplicar uma média diária de 3,38 milhões de doses por dia no início de abril, hoje dá 566 mil injeções diárias. Com a perda do ritmo, países europeus como Alemanha, Espanha e Itália, que tiveram notórios problemas no início de suas campanhas de vacinação, ultrapassaram os americanos no percentual da população já vacinada.

Nem na América do Norte o país está na dianteira, sendo ultrapassado pelo Canadá. Ao contrário de boa parte do planeta, a estagnação não se deve à escassez de doses, mas à falta de braços aptos a recebê-las. E são a esses recalcitrantes que vários americanos inoculados atribuem a culpa pelo novo surto no país.

Sentimento de raiva
As vacinas são muito eficientes contra casos graves e mortes, mas tem uma capacidade menor de conter a transmissão do vírus. Muitas pessoas já inoculadas, portanto, temem transmitir a doença para crianças que ainda não têm idade para se vacinar ou para parentes com o sistema imunológico comprometido.

Diante da maciça quantidade de informações falsas e teorias da conspiração que dizem respeito às vacinas, vários estados, cidades e negócios recorrem à medidas coercitivas. Na segunda-feira, o Departamento dos Veteranos foi a primeira repartição federal a obrigar a vacinação para seus 115 mil profissionais da saúde que trabalham em campo.

Quase simultaneamente, o prefeito de Nova York, o democrata Bill de Blasio, ordenou que todos os funcionários da saúde da cidade estejam vacinados até 13 de setembro — caso contrário, precisarão fazer testes PCR semanais. Na Califórnia, o estado mais populoso dos EUA, uma regra similar valerá para todos os servidores estaduais a partir de agosto.

Quem descumprir as ordens, apontam ambos os estados, ficará sujeito à demissão por justa causa. Várias empresas e locais de trabalho adotam medidas similares: para ser contratado pela United, uma das principais companhias aéreas do país, é necessário apresentar um comprovante de vacinação. Ao menos 600 faculdades e universidades também demandam que seus corpos docentes e discentes se inoculem antes da volta às aulas após as férias de verão.

Contra-ataques
Em meio a discussões sobre até que ponto o Estado pode, ou deve, exigir a vacinação, uma comissão do governo emitiu em maio um parecer de que as leis federais não impedem que o empregador de “demandar que todos seus funcionários que ingressem no espaço de trabalho estejam vacinados contra a Covid-19”. Alguns estados, ainda assim, tentam impor limites.

Em maio, o governador de Montana, Greg Gianforte, assinou uma lei que proíbe os empregadores de exigirem que seus funcionários mostrem seus status de vacinação. Os hospitais do estado também não podem exigir que seus funcionários se vacinem. Na Geórgia, proibiu-se a criação de regras diferentes para servidores públicos determinadas por seu status de vacinação.

Na Flórida, que na semana passada era responsável por um quinto dos novos diagnósticos no país, o governador Ron DeSantis impediu que os empreendimentos do estado demandam comprovantes de vacinação de clientes ou funcionários: até mesmo estádios de futebol americano, cruzeiros ou bares são legalmente obrigados a atender pessoas não vacinadas na península. Medidas similares valem para Utah e o Texas.

Não é à toa que o ex-presidente Donald Trump foi o mais votado nas eleições de 2020 em todos estes estados. Enquanto 88% das pessoas que se identificam como democratas dizem que já se vacinaram ou pretendem se vacinar, o sentimento é compartilhado por apenas 54% dos republicanos, de acordo com dados da Kaiser Family Foundation. Há outros fatores que explicam a hesitação diante da vacina, como motivos religiosos e culturais, mas é inevitavelmente um sintoma da tremenda polarização no país e da desinformação.

Alguns setores do Partido Democrata que demandam medidas mais duras do governo, usando seus poderes regulatórios para incentivar a vacinação. Por exemplo, só repassar verbas federais para os estados que cumprirem suas metas de inoculação ou demandar que todos os funcionários federais se vacinem. Teme-se, contudo, que uma abordagem mais dura seja um tiro no pé: “Qualquer coisa que reduza a oportunidade para diálogo honesto e persuasão não é positiva”, disse ao NYT Stephen Thomas, professor de políticas sanitárias da Universidade de Maryland. “Nós já estamos imersos em sistemas de informação isolados, nos quais as pessoas são suas próprias câmeras de eco”.

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